NOTA PÚBLICA
A morte de Michele Santos do Anjos, no último dia 27, em João Pessoa, alerta a sociedade para importância da doença falciforme na saúde pública. A família tem dúvidas se a vacina contra H1N1 não teria desencadeado o agravamento do estado de saúde da jovem mãe de apenas 19 anos.
O Ministério da Saúde não tem notícia de outro caso semelhante. Os imunologistas dizem que a vacina não provoca septicemia, porque é produzida a partir de componentes mortos do vírus. De qualquer forma, fica o alerta aos portadores da doença falciforme, que só devem tomar a vacina com uma pré-avaliação dos hematologistas que os acompanha.
Seria prudente avaliar o lote de vacinas para investigar qualquer indício de alteração na composição do medicamento. Descartada a hipótese de ter sido a própria vacina a desencadeadora do quadro que levou Michele à morte, as autoridades de saúde terão que investigar as condições biomédicas em que a jovem se encontrava no período em que foi vacinada.
Já se sabe, por exemplo, que pessoas com baixas taxas da hemoglobina fetal estariam em condições não ideais de passar por cirurgias, por exemplo. A doença falciforme tem implicação direta com o comprometimento pulmonar, sendo muito comum o surgimento de pneumonias nos portadores da doença.
É preciso ressaltar ainda as condições do atendimento da Michele em sua última internação. O Edson Ramalho é uma unidade com problemas antigos de infecção hospitalar. Além disso, o hospital não é referência para anemia falciforme na rede estadual. Os hospitais-referência para a doença falciforme em João Pessoa são o Hospital de Trauma e o Arlinda Marques, no caso de pediatria. No âmbito municipal, os hospitais de referência são o Trauminha, em Mangabeira, e o hospital do Valentina Figueiredo, esse também destinado apenas para as crianças. A cidade ainda dispõe como referência do tratamento em doença falciforme do Hospital Universitário Lauro Wanderlei, o HU da UFPB. Talvez Michele teria mais chances se tivesse sido internada numa das unidades citadas acima. Talvez não.
O fato é que a doença falciforme, atingindo mais fortemente as pessoas negras e afrodescendentes, continua invisibilizada na rede pública de Saúde. Há mais de três anos essa Associação vem pedindo providências às secretarias de saúde a implementação de programas de atenção integral às pessoas com esse tipo de hemoglobinopatia.
Recentemente conseguimos fazer com que a Secretaria do Estado da Saúde anunciasse a implementação da segunda fase do teste do pezinho. A triagem neonatal é um forte aliado no tratamento precoce de bebês que nascem com anemia falciforme.
Mas não basta fazer a triagem dos recém-nascido: é preciso que os serviços públicos de saúde na Paraíba, a exemplo do que já ocorre em Minas Gerais, Bahia, São Paulo e Pernambuco, constituam programas especiais de atenção às pessoas adultas que convivem com a doença falciforme, inclusive realizam a busca ativa dos portadores mais velhos.
No ano em que comemoramos 100 anos do primeiro diagnóstico da doença falciforme, óbitos como o de Michele Santos são uma afronta à dignidade humana e à cidadania. Em menos de um ano, essa é a segunda vítima das conseqüências do agravamento da doença falciforme.
A ASPPAH vai dar todo apoio à família de Michele dos Anjos para que sua morte seja detalhadamente explicada. Não podemos ficar mais omissos!